A força simbólica no ato com Dilma e Lula na PUC de São Paulo
Por Rodrigo Viannaoutubro 21, 2014 14:12por Rodrigo Vianna
Desde a campanha de 89 que não se via um ato político com tamanha carga de emoção em
São Paulo. Os paulistas que votam no PT (e também aqueles que, apesar de não gostarem
tanto do PT, resolveram reagir à onda de ódio e conservadorismo que tomou conta das ruas)
foram nesta segunda-feira/20 de outubro para o TUCA – histórico teatro da PUC-SP, no bairro
de Perdizes.
O TUCA tem um caráter simbólico. E o PT, há tempos, se descuidara das batalhas simbólicas.
O TUCA foi palco de manifestações contra a ditadura, foi palco de atos em defesa dos Direitos
Humanos. Portanto, se há um lugar onde os paulistas podem se reunir pra dizer “Basta” à onda conservadora, este lugar é o teatro da PUC.
O PT previa um ato pra 500 ou 800 pessoas, em que Dilma receberia apoio de intelectuais e
artistas. Aconteceu algo incrível: apareceu tanta gente, que o auditório ficou lotado e se
improvisou um comício do lado de fora – que fechou a rua Monte Alegre.
Em frente ao belo prédio, com suas arcadas históricas, misturavam-se duas ou três gerações:
antigos militantes com bandeiras vermelhas, jovens indignados com o tom autoritário e cheio
de ódio da campanha tucana, e também o pessoal de 40 ou 50 anos – que lembra bem o que
foi a campanha de 89.
No telão, a turma que estava do lado de fora conseguiu acompanhar o ato que rolava lá dentro.
Um ato amplo, com gente do PT, do PSOL, PCdoB, PSB, além de intelectuais e artistas que
estão acima de filiações partidárias (como o escritor Raduan Nassar), e até ex-tucanos
(Bresser Pereira).
Bresser, aliás, fez um discurso firme, deixando claro que o centro da disputa não é (nunca foi!)
corrupção, mas o embate entre ricos e pobres. “Precisou do Bresser, um ex-tucano, pra trazer
a luta de classes de volta à campanha petista” – brincou um amigo jornalista.
Gilberto Maringoni, que foi candidato a governador pelo PSOL em São Paulo, mostrou que o
partido amadurece e tende a ganhar cada vez mais espaço com uma postura crítica – mas
não suicida. Maringoni ironizou o discurso da “alternância de poder” feito pelo PSDB e pela
elite conservadora: “Somos favoráveis à alternância de poder. Eles governaram quinhentos
anos. Nos próximos quinhentos, portanto, governaremos nós”.
O “nós” a que se refere Maringoni não é o PSOL, nem o PT. Mas o povo – organizado em
partidos de esquerda, em sindicatos, e também em novos coletivos que trazem a juventude
da periferia para a disputa.
Logo, chegaram Dilma e Lula (que vinham de outro ato emocionante e carregado de apelo
simbólico – na periferia da zona leste paulistana). Brinquei com um amigo: “bem que a Dilma
agora podia aparecer nesse balcão do TUCA, virado pro lado de fora onde está o povo…”.
O amigo respondeu: “seria bonito, ia parecer Dom Pedro no dia do Fico”. Muita gente pensou
a mesma coisa, e começaram os gritos: “Dilma na janela!”
Mas a essa altura, 10 horas da noite, só havia o telão. As falas lá dentro, no palco do Teatro,
foram incendiando a militância que seguia firme do lado de fora – apesar da chuva fina que
(finalmente!) caía sobre São Paulo. Vieram os discursos do prefeito Fernando Haddad, de
Roberto Amaral (o presidente do PSB que foi alijado da direção partidária porque se negou a
alugar, para o tucanato, a histórica legenda socialista), e Marta Suplicy…
Vieram os manifestos de artistas e professores – lidos por Sergio Mamberti. E surgiram
também depoimentos gravados em vídeo: Dalmo Dallari (o antigo jurista que defende os
Direitos Humanos) e Chico Buarque.
Quando este último falou, a multidão veio abaixo. A entrada de Chico na campanha teve
um papel que talvez nem ele compreenda. Uma sensação de que – apesar dos erros e
concessões em 12 anos de poder – algo se mantem vivo no fio da história que liga esse
PT da Dilma às velhas lutas em defesa da Democracia nos anos 60 e 70.
Nesse sentido, Chico Buarque é um símbolo só comparável a Lula na esquerda brasileira.
Aí chegou a hora das últimas falas. Lula pediu que se enfrente o preconceito. Incendiou
a militância. E Dilma fez um de seus melhores discursos nessa campanha. Firme, feliz.
O interessante é que os dois parecem se completar. Se Lula simboliza que os pobres e
deserdados podem governar (e que o Estado brasileiro não deve ser um clube de defesa
dos interesses da velha elite), Dilma coloca em pauta um tema que o PT jamais tratou
com a devida importância: a defesa do interesse nacional.
Dilma mostrou – de forma tranquila, sem ódio – que o PSDB tem um projeto de apequenar
o Brasil. Lembrou os ataques ao Brasil nas manifestações contra a Copa (sim, ali o que se
pretendia era rebaixar a auto-estima do povo brasileiro, procurando convencê-lo de que
seríamos um povo incapaz de receber evento tão grandioso), lembrou a incapacidade dos
adversários de pensarem no Brasil como uma potência autônoma.
Dilma mostrou clareza, grandeza e calma. Muita calma.
Quando o ato terminou, já passava de 11 da noite. E aí veio a surpresa: Dilma foi – sim –
pra janela, para o balcão do Teatro voltado pra rua.
um diálogo com a multidão, usando
gestos e sorrisos. Parecia sentir a
energia que vinha da rua. Dilma, uma
senhora já perto dos 70 anos (xingada
na abertura da Copa, atacada de forma
arrogante nos debates e na imprensa),
exibiu alegria e altivez.
Foram dez minutos, sem microfone, sem marqueteiro. O povo cantava, e Dilma respondia –
sem palavras. Agarrada às grades do pequeno balcão, pulava e erguia o punho cerrado para
o alto. Não era o punho do ódio. Mas o punho de quem sabe bem o lado que representa.
Dilma não é uma oradora nata, não tem o apelo popular de um Lula. Mas nessa campanha
ela virou líder. O ato no TUCA pode ter sido o momento a marcar essa passagem. Dilma
passa a ser menos a “gerente” e muito mais a “liderança política” que comanda um projeto
de mudança iniciado há 12 anos.
Dilma traz ao PT uma pitada de Vargas e Brizola, de trabalhismo e de defesa do interesse
nacional. E o PT (com apoio da militância popular, não necessariamente petista) finalmente
parece ter incorporado Dilma não como a “continuadora da obra de Lula”, mas como uma
liderança que se afirma por si. Na luta concreta.
Uma liderança que – na reta final, nessa segunda-feira de garoa fina em São Paulo – pulava
feito menina no ritmo da rua, pendurada no histórico balcão da PUC de São Paulo. Dilma
ficou maior.
http://www.revistaforum.com.br/rodrigovianna/palavra-minha/forca-
simbolica-ato-com-dilma-e-lula-na-puc-de-sao-paulo/#comment-
113077
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Os comentários são bem-vindos, desde que não contenham expressões ofensivas ou chulas, nem atentem contra as leis vigentes no Brasil sobre a honra e imagem de pessoas e instituições.