Caros Delúbio, Genoino e Zé,
nestes dias que antecedem o Natal, tenho pensado muito em vocês. Pelas voltas que a vida dá e o destino leva, como este ano não será possível dar um abraço em cada um, escrevo esta carta para contar como anda a vida por aqui.
Para não dizer que continua tudo absolutamente igual, como está aí no título, pela primeira vez na história a seleção de handebol feminino do Brasil ganhou o título mundial, com um técnico dinamarquês, jogando contra as donas da casa, em Belgrado, na Sérvia. Foi bonita a festa das meninas.
Fora isso, vocês não estão perdendo grande coisa. Parece que o Brasil já entrou no piloto automático de fim de ano, com a rotina das notícias se repetindo irritantemente. Denúncias continuam sendo publicadas a granel em todas as latitudes, mas investigações que envolvem tucanos se arrastam a passos de tartaruga. A CPI do trensalão na Assembleia Legislativa de Geraldo Alckmin, já devidamente blindada, arrasta-se a passos de tartaruga manca. Do mensalão tucano em Minas, então, nem se fala mais.
O cerco contra o Zé continua implacável. Não querem mesmo que ele trabalhe fora da cadeia, como prevê o regime semiaberto, nem para tomar conta de uma biblioteca. Para dar uma ideia do clima de intolerância e perseguição que persiste, o "Painel do Leitor" da Folha desta segunda-feira publica uma carta da presidente do Conselho Federal de Biblioteconomia, Regina Céli de Sousa, para advertir:
"Em relação a emprego oferecido a mensaleiro, informamos que o exercício da profissão de bibliotecário é privativo do bacharel em biblioteconomia, conforme a legislação determina (...) As infrações à legislação são passíveis de autuação, procedimentos administrativos e criminais, quando necessários, com aplicação das devidas penas".
Ou seja, pedem a aplicação de novas penas a quem já foi condenado, quer trabalhar e está há mais de um mês no regime fechado. A vida é dura, como costumava dizer o Zé.
Outro dia, saindo do elevador de casa na hora do almoço, um vizinho veio me interpelar sobre o que estava acontecendo com o trânsito todo parado há horas na nossa rua, provocando uma sinfonia de buzinas.
"Olha aí o que os teus amigos Haddad e Lula fizeram: esburacaram todo o nosso bairro só para a gente não poder andar". Fiquei tão perplexo com a ira do provecto senhor que nem respondi nada e fui saber o que estava acontecendo. Houve um vazamento de gás numa obra da Sabesp e a Comgas recomendou o fechamento da Ministro na esquina com a Lorena, no Jardim Paulista.
Quando vi o tal vizinho passar na rua à tarde, fui lhe dizer quem estava interditando a rua: duas companhias estaduais, que trabalham sob a responsabilidade do governador Geraldo Alckmin (ver correção no final do texto). Portanto, o atual prefeito e, muito menos, o ex-presidente não tinham nada a ver com isso. Disse-lhe para se informar melhor antes de dizer bobagens e fazer cobranças indevidas. O sujeito balançou a cabeça e continuou andando. Para quem lê nossos jornais e revistas, não importam os fatos.
Por falar em Lula, fui almoçar com ele uns dias atrás, lá no instituto, e o encontrei disposto e bem de saúde, animado com o grupo de estudos que formou para discutir propostas que preparem o país para o futuro, já de olho nas comemorações do bicentenário da Independência, em 2022. Ter projetos e fazer planos para o futuro é o que mantém a gente vivo, com ânimo para enfrentar as dificuldades do presente.
Ah, não sei se vocês já estão sabendo, tem uma novidade que não chega a ser bem uma novidade: José Serra desistiu da terceira candidatura à Presidência, se é que desistiu mesmo, e o Aécio Neves apresentou um esboço de programa de governo, que não agradou muito nem à imprensa amiga, com exceção daquela apartidária e isenta revista semanal. Para mim, o principal adversário da Dilma em 2014 será mesmo o Eduardo Campos, ainda mais se conseguir convencer a Marina Silva a ser a sua vice. Melhor é esperar para ver o que acontece, já que as chapas só devem ser definidas lá para março, abril.
Vida que segue. Saúde e força pra vocês neste Natal e em todos os dias de 2014.
Um forte abraço,
Ricardo Kotscho
Em tempo/correção:
O bom de ter amigos bem informados é que eles não nos deixam errar sozinhos.
Ao contrário do que escrevi sobre a Comgás no texto acima, a informação correta me foi enviada pelo competente jornalista Carlos Brickmann:
"A Comgás não é estatal, não. É particular. O acionista majoritário é a British Gás, ou a British Petroleum. Já a Sabesp é do Governo do Estado, mesmo, e anuncia pesadamente no Brasil inteiro para que todos saibam que, se quiserem ter em Xambioara do Oeste um sistema de águas e esgotos igual ao dela, é só transferir a cidade para São Paulo e tudo bem".
Obrigado, Carlinhos.
Ricardo Kotsho, Audálio Dantas, Fernando Morais e eu, em novembro de 2013.
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